Amores, hipsters e fotografias.

Há vezes em que as respostas aos meus textos são melhores do que os próprios. É o caso desta, do Filipe Zenhas Mesquita.

Boa noite,

Terminei de cavilar a minha ideia e é a seguinte:

Da mesma maneira que tu dizes que a malta posta fotos na noite para impressionar/existir aos olhos da desejada, antigamente escreviam-se poemas de amor. O jovem afectado dava-se ares de poeta tuberculoso e lírico. Acho que o poeminha mais tarde se transformou no hobby da fotografia amadora. Com maior poder de compra e menos leituras (parece um paradoxo), a malta começou a comprar câmaras de fotos cada vez mais caras e a tirar fotos cada vez piores. Recordo-me de ver os blogs de fotografia cheias de fotos a preto e branco dos mendigos e dos pombos dos Aliados e S. Bento. A fotografia e a poesia eram, portanto, duas formas de surgir aos olhos da desejada como alma sensível e como de alguma forma assombrada pela ausência do amor, como que a reclamar uma regeneração pela sua presença. Com o passar dos tempos e com o aumento do poder de compra, estas formas ainda relativamente intelectuais de idealização do eu perderam lugar para o culto do corpo. O metrossexual é o alvor cavernícola do hipster. "O jovem" afectado dedica-se ao seu corpo de forma a construir a imagem ideal de si. Como esta relação entre alma/corpo é extremamente clivada e pode conduzir rapidamente à loucura e a comportamentos sexuais bizarros, surge o hipster. O hipster engole todas as formas de idealização do jovem romântico anteriores. A poesia lírica, a fotografia amadora e o culto do corpo. É a construção de uma visão permanente do outro em nós. mas de um outro completamente idealizado e, portanto, um eu completamente asfixiado por essa idealização. De forma a açambarcar o máximo possível, não se pode implicar realmente com nada. Coca-cola zero. As possibilidades de uma existência infinita, e ao mesmo tempo segura, são enormes. Existe uma simbiose entre o jovem e a cidade, criando um plano sem ponto de fuga. Onde se comia uma porcaria qualquer, hoje come-se o melhor cachorro do mundo e arredores por 10 euros. Uma situação ideal. Uma opção segura. Substitui-se a cidade pelo destino turístico, onde sempre se chega mas nunca onde se está. O mundo resume-se a meias escolhas, onde sempre se pode escolher outra vez porque escolhemos sempre o mesmo.
Resumindo: no esforço de agradar ao outro esquecemos-mos de perguntar ao outro o que lhe agrada. Esta armadilha tornou-se fatal porque jorra dinheiro e tranquilidade.