Os artistas.

Além dos motivos habituais, os artistas bebem álcool porque não é possível trabalhar intelectualmente mais do que 3 horas por dia, sem recorrer a drogas. E, depois da criação, com o cérebro esgotado, há que fazer passar as horas seguintes. Até que, no dia seguinte, se consiga criar outra vez. Alguns tomam drogas para conseguirem criar mais no mesmo dia. Mas isso não costuma dar muito bom resultado. Escrevem livros enormes, fabulosos, pintam quadros deslumbrantes, compõem músicas memoráveis, e depois matam-se. O abuso diário das drogas para a criação tem essa vantagem e essa desvantagem: ultrapassar os limites humanos e criar um enorme sofrimento nas cabeças deles.
Criar é como tomar anfetaminas, ter um orgasmo, andar de montanha russa. Sente-se uma enorme adrenalina no momento, e desfalecimento de seguida. Extenuados, não há nada que lhes apeteça fazer, a não ser sexo ou beber. Há quem tome drogas, agora para adormecer. Há quem force as sestas. Fazem caminhadas para cansar o corpo, dormem, acordam e voltam a escrever, a pintar, a compor. Também vão para o campo ou para a praia, ver o rio ou o mar, para afastar o tempo. Ir para os ecrãs é que não. Isso cansa o cérebro para nada. É lixo. Energia deitada fora. Se calhar é por isso que agora ninguém cria nada. É preciso parar o cérebro para pensar. Depois, como as histórias, os sons e as cores dos livros, das músicas e das artes plásticas são muito mais interessantes do que as da vida real, especialmente porque foram criadas por pessoas parecidas com eles, que pensam de forma semelhante, acham que as pessoas que não criam são diferentes, estranhas, exóticas. E não pensem que as desprezam. São para analisar, para descobrir. Na maior parte das vezes, até gostam delas porque apreciam a normalidade que não sentem. Fazem-lhes perguntas, ficam a olhar para elas a tentar perceber como funcionam, o que as motiva, como vivem, o que gostam, o que fazem ao domingo à tarde, enquanto eles olham para o tecto à espera que cheguem novamente as horas em que conseguem criar. Por isso é que muitos amigos de artistas os aconselham a não deixar o trabalho das 9h às 17h. Pelo menos, estão entretidos nessas horas. E ganham adubo para a imaginação. Têm é que escolher bem os horários. Não vá oferecer-lhe o tempo da criação.