Escolhe a cura.

Nos comentários à minha última crónica, alguns paladinos do progresso negam o que escrevo e dizem que o jornal não devia publicá-la porque não foi comprovada medicamente. E isso fez-me lembrar o comentário que o Luis Oliveira, editor da Antígona, fez sobre o Tratado da Vida Sóbria, do Alvise Cornaro.

Este livro é também um hino  à alegria de viver com saúde, e, acima de tudo, um sério aviso àqueles que se submetem cegamente aos poderes da medicina, depois manipulados e explorados de acordo com os interesses dos consultórios e das multinacionais que fabricam os medicamentos.

Eu já lhes expliquei que o que diz a medicina tanto se me dá como se me deu. Mas eles continuam a enviar-me artigos e a explicar imenso as razões pelas quais eu devia escrever segundo as regras deles e não as minhas. Dizem que os meus textos não são válidos porque não seguem um método, o deles, claro. É tudo uma ladainha de regras e conceitos aos quais eu devo supostamente obedecer.

Dizem-se muito progressistas mas não fazem mais do que substituir deus pela ciência. Põem os conceitos “verdadeiros” e as leis “científicas” no lugar dos dogmas religiosos. Negam conceitos para colocar outros no seu lugar. Tem é de haver conceitos certos e errados, e alguém que lhes diga se o que pensam está de um lado ou de outro. Alguém que valide o que dizem. Ora, o que eu devo fazer é respeitar isso e não escrever. Porque só os superiores pensantes da ciência é que o podem fazer ou legitimar quem o faz. O resto, essa cambada de sapateiros ignorantes, que façam sapatos. Pensar é que não! É impressionante como esta gente não respeita os superiores! E a moda está em todo o lado. Dá para a ciência, para as leis, para os moralistas, para os humanistas e todos os istas que troteiam por aí. Há respeito para todos, menos para nós.

Não posso escrever? Escrevo na mesma. Tenho que esperar que validem o que digo antes de publicar? Não espero. Tenho de ter permissão para fazer? Faço sem ela. É o respeito que me dá permissão? Não respeito. Tenho que justificar porque fiz ou escrevi assim? Não justifico.

Era só o que me faltava escrever o que vocês querem, da forma que vocês querem. Daqui a pouco, tinham ocupado o espaço todo e eu era empurrada para os bordos mais longínquos da vossa terra ideal. Ficava lá na periferia, a fazer-vos vénias, e a pedir esmolinhas de legitimação do meu pensamento.