Sísifo I.

Os deuses tinham condenado Sísifo a rolar um rochedo incessantemente até o cimo de uma montanha, de onde a pedra caía de novo por seu próprio peso. Eles tinham pensado, com as suas razões, que não existe punição mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.

Toda a alegria silenciosa de Sísifo está aí. O seu destino pertence-lhe. O seu rochedo é a sua questão. Da mesma forma o homem absurdo, quando contempla o seu tormento, faz calar todos os ídolos (…). De resto, sabe que é o dono dos seus dias.


Esse universo enfim sem dono não lhe parece estéril nem fútil. Cada grão dessa pedra, cada estilhaço mineral dessa montanha cheia de noite, forma por si só um mundo. A própria luta para atingir os píncaros basta para encher um coração de homem. É preciso imaginar Sísifo feliz.


Camus, em Mito de Sísifo.