Amizade.

Quando conheço uma pessoa, tiro-lhe logo o atrelado. Tiro-lhe o nome, as roupas de marca, o carro, a casa, os equipamentos electrónicos e o resto dos acessórios. Se sem isso a pessoa me interessar, ouço-a com atenção e respeito-a. Se não tiver mais do que isso, não lhe dou atenção nenhuma. Não é por mal. Apenas prefiro fazer amizade com pessoas do que com objectos.

Resposta pública a e-mail anónimo.

Caro leitor anónimo que me enviou uma mensagem electrónica a dizer que não deveria escrever o texto anterior porque me incluo no alvo,

Não me incluo mas, mesmo que me incluísse:

Primeiro, nunca disse que não era gananciosa. Tenho mais batons vermelhos do que preciso.

Segundo, pagaria os impostos ou venderia a casa para comprar um barco como os da Sea Shepherd. Adoro piratas.

Terceiro, prometo que não teria pobres de estimação. Gosto mais de rebeldes.

Atenciosamente,

Fabiana Lopes Coelho.

Sobre o esperneamento dos pungentes e exímios acumuladores de riqueza contra os impostos sobre as suas fortunas.

Caros colossais, pungentes e exímios acumuladores de riqueza,

Eu sei que vos custa aceitar mas, apesar das 10173 teorias sobre a multiplicação dos pães ou do capital:

OS RECURSOS NATURAIS SÃO LIMITADOS.

Mesmo que vocês inventem 7300 justificações para serem muito mais ricos do que os outros – ou porque são mais inteligentes, ou porque gerem melhor o dinheiro, ou porque têm melhores ideias de negócio, ou porque nasceram com tendência para ganhar dinheiro ou que foi uma bênção que obtiveram quando o papa veio a Fátima:

Se eu acumulo recursos, alguém deixa de os ter.

Só há uma terra.

A água pura está a acabar (e, ouvi dizer, a “purificada” com lixívia causa cancro).

Daqui a pouco não há ar puro para respirar (também já ouvi falar que a poluição é uma coisa complicada).

Logo, se eu exploro um recurso, alguém sofre as consequências dessa exploração.

Para produzir qualquer coisa, seja um bem físico ou intangível, é necessário, pelo menos, um recurso natural (uma máquina não é feita de ficção) ou um recurso humano (que também tem capacidades físicas e intelectuais limitadas).

E não me venham com as tretas da eficiência, que ela só significa sofisticação de estratégias para explorar mais os recursos humanos ou naturais, para obtenção de lucro, o que significa esgotar mais recursos, apesar de vocês acharem ou afirmarem que é multiplicação.

Por isso, assumam que são gananciosos. Que têm mais do que os outros porque querem ter mais do que os outros. E não inventem teorias sobre a luta contra a pobreza, porque a caridade é uma coisa nauseabunda, para disfarçar a acumulação da vossa riqueza.

Maus tempos, arte e ficção.

Dizem que a arte e a ficção são necessidades menores em tempos de dificuldade. Mas é quando a realidade se torna insuportável que mais precisamos delas. Não é alheamento do mundo, é construção de um novo. Ao contrário do entretenimento, que é alienação, entorpecimento do pensamento, a arte é florescimento. Enquanto é criada e contemplada, não só liberta a vida da prisão, como revela novas imagens, novas formas de fazer e pensar. Não é irresponsabilidade. É alimentação de espaços de resistência.